sábado, 17 de novembro de 2007

Dos musicais, da beleza e do fim do mundo

Durante o mestrado, fiz uma disciplina com o grande Luiz Costa Lima. O tema era a obra de Joseph Conrad. A lembrança mais vívida que tenho daquele semestre não é, no entanto, de nenhum dos livros do marinheiro escritor que, confesso, nunca me atraíram muito. O que ficou em mim daquelas aulas foi uma frase de John Keats, o poeta, daquelas frases que mudam uma vida. Não esqueço do dia em que Costa Lima escreveu no quadro: “A piece of beauty is a joy for ever”- em tradução tosca, um pouquinho de beleza é uma alegria para sempre.
O mais engraçado é que sempre penso nessa jóia de verso quando estou assistindo a musicais do cinema. Sim, sou o último fã do gênero, assisto a todos, dos clássicos à mais recente tentativa de Hollywood de reabilitar o gênero. E, segundo alguém que me ama o suficiente para ler em mim até o que escondo de mim, gosto de todos, até dos ruins. Estou inclinado a concordar.
Mas, por que falar de musicais agora? É porque, daqui a pouco, o Telecine Cult vai apresentar um dos maiores de todos os tempos, um clássico, “West Side Story” – chamem-me purista, mas me recuso a referir-me a ele como “Amor, sublime amor”, título dado em português. Produzido em 1961 e dirigido por Robert Wise, é um daqueles filmes inesquecíveis, você vê e fica com as imagens guardadinhas no de dentro seu até ficar velhinho e virar esquecimento. A piece of beauty.
A história? Mais clichê impossível. Afinal, é uma adaptação de “Romeu e Julieta”. Sai Verona, entra a Nova Iorque dos anos 50. Saem Montéquios e Capuletos, entram gangues juvenis de porto-riquenhos versus os jets, os nativos da cidade. Junte uma Natalie Wood linda, jovenzinha e doce. Agora adicione canções inspiradíssimas, como “América” e “Maria”. A joy for ever...
É engraçado essa fascinação que os musicais causam. Ora, são verdadeiros atentados à verossimilhança. O sujeito está lá, no meio de uma chuva torrencial, e, de repente, sai dançando, chapinhando nas poças, cantando “I’m singing in the rain...”. Inverossímil? Talvez (confesso que já reproduzi a cena....). Inesquecível? Definitivamente. Musicais fascinam porque falam com partes da gente que, nesses tempos de distúrbio, gostaríamos de deixar adormecidas. Aquelas partes que nas horas cruciais, quando você já está com a emoção no limite, sussura uma canção no seu ouvido, um pano de fundo completando a cena. Afinal, eu defendo que a vida devia vir com músicas-tema, igual seriado americano.
Take 1 – Panorâmica por sobre montanhas suíças. Lindas. Julie Andrews, braços abertos. As colinas ganham vida com o som da música. Fiquei mais vivo depois dessa. Take 2 – Jennifer Hudson, triste de doer, perdendo tudo, o amor, a carreira, os amigos, a dor é física de tão poderosa. O desabafo: “Eu não quero ser livre! Eu vou ficar, e você vai me amar!”. Ainda bem que cinema é escuro. Take 3 – Audrey, Audrey, tão feliz, tão completa, cantando “Eu poderia ter dançado a noite toda e ainda pediria mais”. Eu dançaria com ela naquela hora. Take 4 – Nicole Kidman, de tirar o fôlego, descendo por um balanço e cantando que os franceses morreriam felizes por amor. Não sou francês mas, ali, morreria também. Ah, tantas cenas que eu poderia ficar repetindo aqui...
Música e imagens. Som e fúria. Dizendo – cantando – que ainda existem lugares secretos, Pasárgadas escondidas para onde fugir quando se fica triste, “triste de não ter jeito”. Deixo que Caio Fernando Abreu me ajude a pensar no porquê de amar os musicais. Porque eles ajudam a espantar o fim do mundo:
“O fim do mundo era o silêncio e o vazio. Era a solidão absoluta. (...)Eu precisava dar um passo além do fim do mundo. Foi então que eu descobri o jeito de dar esse passo. A maneira de vencer o fim do mundo era enchê-lo de sons e de cores. Então uma canção brotou do fim de mim, e eu cantei...” (ABREU, Caio Fernando. Pode ser que seja só o leiteiro lá fora. In: Teatro completo. Porto Alegre: Sulina, 1997)
P.S.1: Os filmes citados nos “takes” são: A noviça rebelde, Dreamgirls, My fair lady e Moulin Rouge.
P.S.2: Ironia da vida....acreditam que tenho um compromisso na hora do filme?

9 comentários:

Da Matta disse...

Lindas palavras. Acredita que eu, que não sou muito fã de musicais, vou ligar o telecine cult e passar esse fim de tarde vazio frente à minha quase inútil tv? Só para assistir West Side Story.
Marco, seu blog vai entrar pra hitória, rss. Vc vai competir com a senhora de 97 anos q ganhou o prêmio de melhor blog recentemente.
rss

Abraços, Mestre!

Anônimo disse...

Professor também confesso que não sou muito fà DE musicais mais falando assim, talvez mude de idéia... Não sei se Dirty Dancing pode ser considerado um musical clássico, mas é o que tem música que mais gosto. Mudando de assunto, estou sugerindo a todos que assistam a peça Carolina em cartaz no CCBB para quem gosta de Machado é imperdível, é de quarta a domingo às 19:30, aproveite pois ficará em cartaz até 25 de novembro, aproveite e veja também a exposição Lusa-A matriz portuguesa que ficará até 10 de fevereiro de 2008. Até terça. A marquesa

Anônimo disse...

Realmente os musicais são eternos e sua declaração de amor a eles só me fez confirmar o quanto você tem bom gosto .Por falar em musicais o grande trauma em minha vida é nunca ter assistido uma ópera,que pode ser considerada,me corrija se estiver errada,a inspiração para os musicais.Você já assistiu Marco? Um abraço e até terça.

Anônimo disse...

Que interessante!
No dia 17, você falava de musicais... Da magia que a música traz até aos filmes.
E eu leio logo hoje, dia 22, dia do músico. O que isso teria de interessante? Para você, talvez nada, mas me encanta perceber o quanto somos dependentes deles (os músicos) ao passo que somos amantes da música.
É... Não sou tão encantada assim pelos musicais, mas pela música... Talvez uma música traduzisse melhor, mas prefiro não arriscar. rs
Deixando minhas viagens de lado, AMEI seu blog! Assim que cheguei em casa, passei logo por aqui a ver o que me aguardava. Expectativas superadas!
Obrigada por abrilhantar nossos dias com suas palavras! Nunca pude ouvir as histórias contadas por sua avó, mas posso lhe garantir que, assim como você nos contou no nosso primeiro dia de aula sobre a sua admiração em relação à grande contadora de histórias que ela era, eu o farei (não falando de minha avó ou da sua, mas de um professor especial e um profissional que possui toda a minha admiração). Sou sua fã!

Anônimo disse...

querido professor. seu blog está belíssimo!... amei a sua primeira crônica. e essa eu gostei bastante tambem, mas, a primeira. li novamente anteontem, ontem, hoje. e justamente hoje, eu li após escrever, o que eu creio ser a minha primeira crônica. você vai perceber que a Labirinto: cansaço, mexeu bastante comigo.

um abraço marco, nos vemos nas nossas DUAS aulas semanais.

Thiago

Anônimo disse...

www.fotolog.com/the_shaaman


esse é o endereço onde eu postei a crônica..


abraços.

Unknown disse...

Marco, parabéns pelo blog!
Gostaria de ver em todos os professores a mesma essência e prazer que você tem em dar aula de literatura. Você consegue conquistar a todos - mesmo aqueles que não são de letras - E com isso proporcionar aos seus alunos a sensação de que a leitura sem dúvida nenhuma deve ser um prazer.
Que bom que pude aproveitar mais das suas aulas estes semestre!!!

Beijos

Dayana Drumond. UERJ/FFP

Anônimo disse...

oi marco
adorei seu blog
eu tambem nunca fui fan de musicais, deve ser aquele preconceito impostos a nós sobre os filmes velhos.(a mim pelo menos)
Mais eu vi A noviça rebelde e outros musicas q marcaram a infancia da minha mãe, e gostei muito, passei a admiralos.
marco gostei mt mesmo do seu blog.
vc viu no seu orkut como eu fiquei atorduado ao ler labirinto:cansaço?.rs
marco adorei ter aula com vc.(que sorte q vc foi parar no prosper)
abraço marco xau.

Ingrid Moura disse...

Ah, os musicais! É muita emoção para o meu jovem coração... rsrs Eu sempre saio em êxtase de um musical e o motivo é bem simples:eu amo cinema, eu amo música; imagina tudo junto, de uma vez só...O fascínio é inevitável mesmo.
Os musicais não perdem o frescor!